VIDEOPOEMA
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"Banhemo-nos, ó Pródice..." (AG 5, 12)
A Antologia Grega (AG) é a maior coletânea de epigramas gregos de todos os tempos. No Livro 5, conserva 310 epigramas eróticos, compostos em grande parte (mais de uma centena) por poetas helenísticos (323-30 a.C.), nomes de destaque dentro do gênero. Há no volume, contudo, alguns nomes singulares, poetas tardios, ilustres desconhecidos de quem pouco ou nada sabemos, pois só restam seus versos. Este é o caso de Rufino, autor do século IV d.C. que responde por 39 epigramas no Livro 5, conforme a edição de Page (1978), um número expressivo de poemas.
No poema 12, o eu-lírico exorta a amante Pródice na direção dos prazeres, incitando-a a aproveitar o momento. Temos encenada, pois, uma tópica muito cara à poesia lírica, que combina o tema da efemeridade da vida com a urgência dos prazeres. Ela pode ser resumida na breve expressão de Horácio com que Francisco Achcar nomeia e investiga inúmeros poemas clássicos e outros em seu livro Lírica e lugar-comum (1990): trata-se da tópica do carpe diem. Nesse gênero (ou subgênero) lírico, “o hedonismo é sempre apresentado como resultante lógica da consciência da efemeridade” (Achcar, 1990, p. 67) e os amantes, obcecados pela certeza da morte, agitam-se na direção dos prazeres breves como o momento. A gênese da tópica pode ser encontrada entre os gregos, mas seu pleno desenvolvimento costuma ser atribuído aos latinos, especialmente a Horácio. Não obstante, os poetas helenísticos compilados na AG cultivaram a tópica em questão, além de outros, como Rufino, que tardiamente também o fizeram em língua grega. Os versos do poema 12 claramente atestam o lugar-comum: a exortação envolve um pequeno ritual preparatório, envolvendo banhar-se (Λουσάμενοι, v. 1), coroar-se com guirlandas (πυκασώμεθα, v. 1), para em seguida inebriar-se de vinho (na imagem dos cálices maiores, κύλικας μείζονας, v. 2), o que equivale no entendimento dos amantes a alcançar os prazeres (χαιρόντων, v. 3). O termo ákraton (ἄκρατον, v. 1), outra imagem do deleite, traduzível por “[vinho] sem mistura”, não deve ser lido literalmente no contexto, como recomenda Page (1978, p. 73), já que a prática de beber vinho puro caracteriza o imoderado, e não os hedonistas em questão.
Quanto às imagens da efemeridade da vida, causa da urgência de aproveitar o momento, vemo-las no terceiro verso, predicando a vida (βίος) como breve (βαιός), na evocação da velhice (γῆρας, v. 4) e na presença da morte (θάνατος, v. 4), esta entendida como o ponto final (τέλος, v. 4) de toda ventura humana. O poema se enquadra perfeitamente no gênero carpe diem, ao evocar seus principais lugares-comuns (tópoi). Na tradução, utilizo decassílabos e decassílabos “quebrados” (versos de seis sílabas) para verter os dísticos elegíacos gregos (hexâmetro mais pentâmetro) e predomina a acentuação heroica em português, exceto no v. 5, onde é sáfica.
REFERÊNCIAS
GOW, Andrew Sydenham Farrar; PAGE, Denys Lionel. The Greek Anthology: Hellenistic epigrams. Vol. II. Commentary and indexes. Cambridge. Cambridge University Press, 1965.
PAGE, Denys Lionel. Rufinus. Cambridge. Cambridge University Press, 1978.
PATON, William. The Greek Anthology (10-12). London: Harvard University Press, 1999 (1ª edição 1918).
SOBRE O AUTOR
Luiz Carlos André Mangia Silva é professor associado da UEM. Pesquisa e traduz poesia helenística (epigrama) e romance grego (Dáfnis e Cloé, de Longo de Lesbos).